domingo, 2 de março de 2008

Ariadne e Dionísio



Ariadne era filha do rei de Creta. Teseu se ofereceu para ir a Creta e enfrentar o minotauro do labirinto. Ariadne se apaixonou por ele e, para ajudá-lo, deu-lhe um espada e um novelo de linha para achar o caminho de volta. Teseu foi vitorioso e Ariadne fugiu com ele para a sua terra de origem. Os dois pararam para descansar na ilha de Naxos, contudo, enquanto ela dormia, Teseu foi embora, abandonando-a. Ela ficou inconsolável, mas Vênus, tendo misericórdia dela, mandou um amante imortal, Dionísio até a ilha. Ele tentou consolá-la mas, de acordo com algumas tradições, pediu a Ártemis que a mate. Quando Ariadne morreu, virou uma constelação.
Eis a MINHA VERSÃO DA HISTÓRIA:

_ Quer?_ pergunta-me na víscera como se de dentro falasse. A língua na orelha. O cheiro de corpo. Antes dele, eu só e a ilha. Ela me gastando e eu me nutrindo dela. O sono com o osso na pedra a esquecer de ti [porque, enquanto sonhava sem dor, fui abandonada: ancas na areia, as tuas no mar]. “Teseu, te amei tanto!”. Agora a terra preenchida. Oferenda do mesmo mar. “Mar que te levou”. E eu [as tripas assadas] sugando tua carne no meu oco.
[Esgoto-me no extremo]
_ Por que está tão séria?_ quer saber o deus. [Dionísio, criado entre ninfas]: seu olhar de muitas camas nunca entenderá. “Tenho as dores dos que ficam”[Teseu foi]. Um silêncio e um beijo em minhas tetas secas- [me consola com seu gozo]. Mas ignoro sua sede e irrito a parte-homem da divindade. _ Ariadne, quem sabe você ganha hoje de presente a sua morte e não tem de se preocupar com tantos amanhãs.
[Um deus que não sabe de eternidades]
Dou-lhe minhas costas: sela de fartos pesos. E descanso a cara ausente no braço de um amante que não é o meu [porém é mais quente que as rochas]. Mal fecho os olhos, cego-me. Um punhal me acerta e legitima a carniça que eu já era. Minhas milhares de peles se destroem: miríades de cacos brancos. Finalmente, durmo sem lembranças.

19 comentários:

Ju. disse...

um tipo de escrita diferente.
meio que inspira, cativa, chama a atençãO...
mt interessante =)

beijoss

Renato Ziggy disse...

Que linguagem diferente, visceral! Universo curioso o seu...

Obrigado pela visita! Bjos,
Ziggy

Laerte Magalhães disse...

Penso que a referência mitológica funciona como um duplo, o signo de alguma coisa que a experiência do real quer dissimular. Há passagens bem construídas que se revelam denunciadoras de algo experimentado. De qualquer modo, bastante instigante e, justo onde se apresentam tais âncoras de real, um tanto erótico e excitante.

Cláurio Neves disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cláurio Neves disse...

UAU...

Anônimo disse...

Uh, também não estou de dedos-para-as-teclas. Uma espécie de preguiça causada por não inspiração e/ou receio de parecer pedante - já que há tantos que escreveram tão bem... Mesmo assim, prosseguirei. Qualquer hora dessas recorro ao maior psicanalista de todos os tempos: a máquina-de-digitar.

Muito bom esse texto. :)
Eu diria que a gente gosta de temática sexual, mas sem parecer pornográfica. É suja, mas não pornográfica. É um sexo sincero (e a sinceridade humana cheira a vulgaridade para os tradicionalistas-pinto-mole). Texto tem que ter tesão.

Amplexo.
p.s.: tenho gatos, mas prefiro cães (queria ter tantos quanto Hilda).

Raisa. disse...

Acontece sempre, romper a pele, o ser partindo-se, de uma cor nascem outras tantas cores que nos cegam. É uma condição existencial tornar-se memória, todos nós estamos fafados a em algum momento nos transformarmos em figuras anônimas e patéticas, perdição no imenso labirinto que é não esquecer.


Bacana essa versão, mas não me convence, afinal "o poeta é um fingidor", não se pode confundir as personas inconstantes =)

Karla Hack dos Santos disse...

"Um punhal me acerta e legitima a carniça que eu já era."

Descreveu toda a dor dela nesta frase crua!

Linda versão sua... escreve com todo seu corpo... Me prendeu do início ao fim do texto.

Adorei!

. disse...

Fantastico é a sua escrita!! Que orgulho da família!
Eu não posso fazer nenhum comentário elaborado demais como os outros visitantes/escritores do seu blog porque eu sou leiga de tudo, mas qualquer um com um pouco fineza reconhece que isso é arte!
aproveitando para comentar os comentários: " É suja, mas não pornográfica. É um sexo sincero (e a sinceridade humana cheira a vulgaridade para os tradicionalistas-pinto-mole). Texto tem que ter tesão."
iueahieah muito bom!!

fãzona da medusa impune!

Anônimo disse...

A linguagem dos Deuses diria Homero!

Lindo, história triste:/

Beijos

J. Lara disse...

Parabéns, você escreve muito bem...
E sem nenhuma firula nem palavras complexas: Gostei muito!!!
Vô tá sempre aqui pra ver mais
;D

Anônimo disse...

pelo menos a dor acabou

Anônimo disse...

Parou de escrever, Medusa?

Don't stop the machine, baby!
Bisou-bisou,
thebarbara.

p.s.: já ouviu uma banda chamada Bikini Kill? Ouça.

Anônimo disse...

Não sabia que estavas redigindo um romance. De que trata? Espero que as expressões sejam fortes como ejaculadas certeiras e as metáforas constantes como um sonho sob análisa freudiana.

Obrigadíssima por visitar meu blogue. Tu és das únicas que o lê com frequência. :)

Não deixe de me colocar a par das novidades. Ósculo,
the B.

Anônimo disse...

*análise

Natureza Poética disse...

Parabéns! "Ariadne e Dionísio" é uma leitura envolvente.
Gostei de passar aqui. :) Abraços!

Anônimo disse...

tente ler a leitura de foucault sobre esse episódio...
está no livro ditos e escritos 2... acho que o título é ariadne enforcou-se

Anônimo disse...

Olá, encontrei seu blog meio que por acaso e adorei sua escrita. Sua forma de contar a relação entre Dioniso e Ariadne é maravilhosa.

Por coincidência, nos últimos posts de meu blog, estou tratando de Dioniso. Neste texto trato da influência do deus sobre as mulheres:

http://tempo-horario.blogspot.com/

Espero que vc visite e mantenha contato comigo.

BRUNO

Anônimo disse...

Lindo texto! Parabéns!