segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Verborragia inaugural

Responsabilidade x controle

Deixando fluir, depois controlo este texto.

“sou uma mulher madura
que às vezes anda de balanço

sou uma criança insegura
que às vezes usa salto alto

sou uma mulher que balança
sou uma criança que atura”
Martha Medeiros

Leva-se um tempo para se perceber que a Terra já gira sozinha, que ela não depende de mim para que os dias persistam em vir e vir.
Nunca compreendi a dicotomia entre controle e responsabilidade. Dicotomia para mim, como o bem e o mal; pois, quando vislumbro um, o outro some como o lado escuro de um planeta.
E o meu satélite só captura um lado por vez.
Captar com os olhos essas duas imagens metafísicas ao mesmo tempo é um eterno aprendizado de vida. E eu sou grosseira iniciante na lição de confiar que Aquele que fez todo o universo também é capaz de me guiar pelas ardilosas horas sem que eu me estabaque numa parede e contemple o meu rosto sangrento.
Entre um beco e outro, descobri que essas duas entidades são muito diferentes. Uma, corroboração e a outra é corrosiva. Terrível fazer definições, mas o humano não escapa delas: a responsabilidade é a consciência de que posso e devo contribuir. O controle é apenas loucura, blasfêmia opressiva, a demente tentativa de mandar no vento.
Meu último desejo para o resto da vida: ser vitória e fracasso num mesmo dia de tédio ou glória. Poder me reconhecer no espelho, sempre uma só face_ feliz e descontente, mas esperançosa a todo o tempo.
A agendinha de couro registra todas as obsessões. A cada semana, um plano perfeito para sobreviver à angústia, à falta do que fazer, ao medo da solidão. Mas eu estou cansada de projetos. Ainda mais dos projetos magistrais! Porque eles só me dão a rápida ilusão de que eu posso controlar tudo o que me envolve. Logo, estou novamente absorvida pelo meu sazonal desespero e total falta de perspectiva.
Por isso, não quero precisar me viciar em alguma coisa só porque ela, às vezes, funciona e me enche da satisfação que, enlouquecidamente, busco. Quero ter prazer e vivê-lo, mas sem abandonar a consciência de que não posso controlar a sua duração ou a sua freqüência.
Quero ter a humildade de me deixar levar pelos movimentos de rotação. De, na verdade, admitir que foram eles quem sempre me levaram.
Tenho problemas com os meios. Adoro começos, adoro finais. Acho ótimo que as coisas acabem. Quem leria um livro interminável? Eu certamente não. Não faz parte da minha personalidade que aprecia se desligar, que se deleita com um fechamento, que só gosta das coisas porque tudo pode acabar um dia, então devemos aproveitar agora. Também amo inícios. Tantas expectativas! Tantas surpresas por vir! Mas os meios são somente o trabalho, o não-compreender-ainda, o não-estar-pronto, o não-poder, o não-ser. É a pressão das metades que me aniquila! O miolo da existência é cru.
É no meio-tempo que me perco.
Seria tão melhor ser companheira do acaso, respeitá-lo e admirá-lo.
Seria tão melhor ser grata pelo imprevisto, pelo menos, eu fujo do enfadamento.
Ser grata pelo enfadar, pelo menos, eu fujo da mania de euforia.
Ser grata por estar eufórica, pelo menos, eu me sinto viva!
Uma ode ao descontrole!
Mas aí me vem essa fome de viver, de sanar a vida, de não sentir tanto e de sentir em absoluto. E toda boa intenção amarra-se a si mesma num saco de lixo e esgota-se apenas no verbo.
Eu corro três vezes mais rápido do que qualquer um (e isso me faz sentir melhor, especial e digna de amor); mas, de repente, minhas pernas ficam exauridas e meus tornozelos torcem para me impedir de continuar.
Então, preciso esperar três vezes mais que qualquer um e, quando retorno à corrida, é como se estivesse no mesmo lugar, ao lado das mesmas pessoas que tinha deixado para trás. Como no ponto de partida outra vez. Como quando eu não havia se quer tentado. Então, nada mais vale a pena.
Uma parte mais visceral e desbocada de mim teria a coragem de perguntar: como aprender a ser normal? Mas não falo nada, só sinto e calo, sinto. E sinto na medida em que busco me anestesiar do sentimento. Sou ser reativo e não racional. Tenho minha própria espécie.
Mas desejo, e desejo ardentemente, não precisar, de tempos em tempos, de bolinhas brancas, e depois brancas e achatadas, depois coloridas e ovais, depois líquidas, depois esfareladas, depois sem gosto de nada, sem cheiro de nada, sem barulho de nada, sem formato de nada...do Nada.
Penso até que os momentos de ansiedade me ligam com a pessoa que sou: necessidades, gente, carnes e peles, ossos alvos. Mas, também, me levam a acreditar que sou enferma do veneno que gerei no próprio ventre e, disso, não há cura.
Tento encontrar esse ponto obtuso que chamo de meu desafio de vida, mas logo me vejo vítima do outro extremo: um entusiasmo patológico, que se olvida de que sou apenas carcaça ambulante, mas me pinta majestosa e ENORME.
Permuto-me toda.
A escancarada e opaca verdade é que a minha doença é medo de rejeição. Tenho receio de ser quem sou e não me amarem e apreensão de ser quem não sou e me amarem. Temo as máscaras e a abstinência delas. Como uma penélope, teço e desteço as fantasias que me faço na espera de um ulisses, que julgo ser, não uma pessoa, mas um final feliz, uma derradeira alegria.


Mesmo a mosca que, incessantemente, bate no vidro, até ela se move de lugar e, entre erros e acertos, um dia sai de seu cárcere.

24 comentários:

flora egecia disse...

modestia parte ficou linda essa foto aí em cima ahn.hahaha

beijooo

Unknown disse...

AAAAAAAAHHH DEMAIS...DEMAIS!!!
ADOREI...A PROFUNDIDADE!!!
A GINGA LITERÁRIA!!!
=)

Unknown disse...

gatissima!
amei!!
=**

Unknown disse...

Srta Colmenero, pois agora você é mais que digna de ser chamada assim, mandou mt bem...adorei seu texto...vou divulgar esse blog...sucesso que vc merece! bjo

Cla disse...

Patsvalda mulher!
só pra te dizer q eu vim, li tudo, e vou ler depois de novo (pq eu sempre preciso ler as coisas mais de uma vez). mas eu nao sei comentar... pessimo isso... eu sempre digo só "lindo, foda, etc..."
mas saiba que vc eh uma das minhas escritoras preferidas...

Anônimo disse...

Sei que é babaca da minha parte fazer críticas logo no primeiro post, mas preciso verbalizar isto: é triste ter uma romancista presa no pequeno espaço de um blog. Esse seu texto não é uma crônica, mas a reflexão que inicia a narrativa de um romance que eu leria na Siciliano, então fecharia o livro e falaria: "É, o livro é bom! Vou comprar!" Mas vale a intensão! Arrase, gata!

Mona lisa Budel disse...

Olá ... encontrei seu endereço no orkut ... bom texto, entrei por aqui de curiosa qdo vi citado o nome de Hilda Hilst e Simone de Beauvoir, que também são infuências bem fortes nos meu agir literário, inccluindo Florbela Espanca, Manoel de Barros, Henry Muller, e Rubem Fonseca. è preciso sempre dizer mais além da carne e além do corpo, além das mascaras e junto aos rins ... e que tudo seja um tanto crú !

bom texto, passo por aqui de novo pra ler, os novos textos ...

www.monalisabudel.blogspot.com
www.gritosesussurrosurbanos.blogspot.com

Fada Azul disse...

Afoto está linda e o texto de uma profundidade singular.
Vc é um talento moça.
bjus

Unknown disse...

Segura!!Perfeito jogo de palavras!! Ótimo tema e profundidade... e foto shok!! no topo!! 1000!!

Patrícia Colmenero disse...

Agradeço a todos os comentários que, certamente, instigam minha ânsia poética e me estimulam a prosseguir nesse não-caminho da literatura. Respondendo ao comentário do Thiago, concordo com ele e esse texto não pode ser considerado uma crônica. Já tinha pensado nisso, mas acabei colocando como crônica não sei porque. De fato, na minha terminologia, o texto é uma verborragia!
Assim que eu descobrir como editar essa parte do marcador sem correr o risco dos comentários sumirem, eu o farei.

Rafaela Prado disse...

Pat, já disse e repito: as suas fotos são as mais lindas! Amei essa do blog, assim como amei o texto!! Vou passar sempre por aqui, e pode deixar que vou divulgar também!!
Beijocas! :*

Guilg7 disse...

Nossa...d+ viu.....oh gostei muito.....

ah se de paxa awe o my blog plx...

http://lg7fortalezace.blogspot.com/

Unknown disse...

Hey! Gostei muito moxa! Faz pensar bastante! Ótima reflexão!
Obrigada viu, vou tentar ser frequentepor aqui!!!
Fãs da Patty!!! *\ô/*
Uma ode ao descontrole!
BjuxXx

Natty disse...

como eu adoro isso aqui!

tá tudo muito lindo por aqui!

Belo Texto
Bela Foto
etcetera e tal...

Virei fã(adoro essas breguices!hihihiih)

x=*

Bruno Carlucci disse...

Muito bom, eu estava precisando ler algo do tipo, esse período de final/início do ano sempre me faz pensar sobre as minhas responsabilidades e a minha frustração de não ter controle sobre tudo.

E concordo com o Thiago, eu leria seu texto em uma livraria de bom grado. =)

Wanderson Machado disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Wanderson Machado disse...

fiquei um tempo admirando a foto. me parece que eu já havia contemplado este mesmo ângulo trezentas vezes, as mesmas cores, o mesmo movimento, era como se eu já tivesse sentido aquela mesma sensação antes, só não havia tido consciência dela. a foto é incrível, me enclausurou ao seu blog desde o primeiro segundo. entrega minha sincera admiração à fotógrafa. vejo que você continua a minha escritora favorita. fico muito feliz por isso. o seu estilo está menos uterino, está mais crú, mas não menos corrosivo. como eu já disse a você diversas vezes, você merece estar no topo dos escritores deste país, anunciando auroras e decretando crepúsculos. há de chegar esse dia. sinto falta da minha amiga e de beber em você a profundidade dos sentimentos que parece faltar em mim. parabéns pelo blog. em breve teremos de nos encontrar de novo. beijos.

Unknown disse...

Agora eu consigo!!!

Gostei do texto! Você escreve muito bem! E esse estilo de deixar as palavras transbordarem sem tentar controlar muito é bem interessante! Gosto muito de ler coisas assim, por isso continue escrevendo que eu serei uma leitora assídua!
Uma coisa que eu pensei lendo esse texto foi que nós insistimos em achar que não fazemos parte de tudo, que nossa existencia é independente, quando na verdade tudo acaba sendo independente de nós. E é ai que nos sentimos um grão de areia. Mas será que um grão de areia faria falta? Quem sabe...

A foto ficou perfeita!

beijos guria!

J.R. Lima disse...

Muito bom isto.
Primeira visita, grande e boa surpresa!
Angústias à parte, a melhor parte é o frio na barriga...
Não sei bem porque, mas gosto mais do trajeto que da chegada, mais da viagem que do destino.
Realmente muito bom o texto!
O início me lembrou de um poema do Leminski:
.
***
nunca sei ao certo
se sou um menino de dúvidas
ou um homem de fé
.
certezas o vento leva
só dúvidas ficam de pé

(paulo leminski)
***
.
grato por escrever!
.
(ah, os marcadores vc edita num campo na parte de baixo da janela de edição de mensagens, e não perde os comentários, não.)

quesacoterquecriarconta disse...

lindo texto.

o belo da vida é se permitir...
perder o controle.

Unknown disse...

Bem, reconheço multifacetas de personagens já consagrados pela melancolia infindante dos dias escuros em que a juventude deveria brilhar, no seu texto.
Não que seja bem, nem que seja mal, algumas palavras só precisam ter sentido oral. Digo isto por denotar uma infinidade de palavras que estando ali, são apenas recortes de uma personalidade que não se consolidou.
A deixa é escrever,alter egos são fáceis de reconhecer... são tantos..Melissa Paranello, Christiane F. agora a mais nova brasileira da turma a tal filhinha do Dias Gomes e por ai vai...

Nossa isso já é mais do que um comentário.
No próximo post continuamos...
espero visitas.

www.http://noirdsir.blogspot.com/

Anônimo disse...

Muito bom o texto
Ainda mais pq rolou uma certa familiarizaçao pro fim
O blog todo ta massa!

BJao

Anônimo disse...

Eu adoro.com.br
Su-ce-sso!
Aff, demorei pra entrar, mas amei!
bjos, gorda!

Unknown disse...

quando precisar de um compositor, estarei as suas desordens.

santupy